segunda-feira, 10 de abril de 2023

Gravador de rolo Studer B67 - PARTE 4

Chegou a grande hora pessoal! É isto, hoje terminamos o restauro deste belo Studer!

    Terminados os reparos, o recap, as limpezas, só resta agora a parte mais fácil, a calibração, montagem e testes. Todas calibrações do Studer são facilmente acessíveis através de trimpots em cada uma das placas dedicadas às diversas funções: play, rec, etc.


Trimpots da placa de play

    É possível ver pela foto que, por se tratar de um gravador para uso profissional, existem 3 ajustes para cada uma das três velocidades em separado, para a placa play.


Trimpots de placa de rec

    A placa de gravação segue a mesma lógica, de 3 ajustes para cada uma das três velocidades. Basicamente são ajustes de nível de gravação/reprodução e ajustes de equalização e bias. O ajuste deve ser feito com uma fita especial de calibração (tipo MRL), além de ajustes de tensão com um tentelômetro.

Tentelômetro

    A resposta em frequência é ajustada com auxílio de um Analisador de Áudio Agilent 8903B, que faz a análise completa da resposta em frequência nas 3 velocidades, se conecta por USB a um PC e nos dá resultados prontos e automatizados! Temos recebido pedidos de mais informações sobre nossa oficina e os equipamentos que usamos, então deixaremos isso para uma postagem em nosso canal no Youtube. Para quem não nos segue lá, acessem este link e se inscrevam.


Agilent 8903B

    O resultado final deste restauro? Um espetáculo, que você pode acompanhar pelo vídeo abaixo:




    Agradecemos a todos nossos amigos e clientes pelas mensagens que recebemos durante este restauro! É sempre um prazer poder trazer estes equipamentos de volta a seu perfeito estado, e, especialmente,  ter o reconhecimento de nosso trabalho pelos maiores amantes de áudio de nosso país. Até a próxima meus amigos!



segunda-feira, 3 de abril de 2023

Gravador de Rolo Studer B67 - PARTE 3

    Estavam ansiosos por mais um capítulo deste restauro? Pois eu estava muito ansioso para poder compartilhar mais novidades com vocês!
    Agora é hora de iniciar um recap. O gravador funciona, todas funções de transporte atuam, há entrada e saída de sinal pelas placas de áudio. Este é o momento correto de se fazer um recap completo e posterior calibração. O primeiro passo como já disse antes é o planejamento. Plan twice, build once, lembra-se? O primeiro passo agora é abrir o esquema elétrico e avaliar TODOS capacitores eletrolíticos e de tântalo que devem ser trocados e planejar qual o tipo ideal de capacitor a ser usado. Vou tentar ser mais claro, para quem não é da área. Quando se planeja um recap, nem sempre o ideal é trocar os capacitores exatamente pelos mesmos tipos de capacitores usados originalmente. A tecnologia dos processos fabris evoluiu muito e temos hoje tecnologias muito superiores de capacitores de tamanhos perfeitamente utilizáveis em posições que não podiam ser originalmente usados há 40 anos atrás. Por exemplo, temos hoje capacitores multicamadas (MLCC) pequenos o suficiente para substituir os capacitores de tântalo. Capacitores MLCC são muito mais duráveis e estáveis a longo prazo e são um excelente upgrade para os tântalos originais. Além disso, temos hoje capacitores muito superiores para uso em posições de acoplamento de áudio, bypass, etc. Cabe a quem está restaurando saber selecionar exatamente a melhor opção de capacitor moderno para o melhor desempenho final possível do equipamento. O custo de capacitores MLCC é bastante alto quando comparados a eletrolíticos, mas seu desempenho é muito superior e ideais para uso no B67.

Capacitor KEMET MLCC

    Vamos então analisar o esquema elétrico do B67 por completo e definir uma lista dos capacitores a serem trocados... a lista é grande, preparem-se!

Planilha de troca de capacitores

       É isso mesmo, são mais de 100 capacitores! E obviamente, vários valores diferentes, tipos diferentes, e marcas diferentes, um por um selecionados de acordo com a função no circuito. Escolhemos os Epcos TDK para bypass, Nichicon KA Audio para acoplamento, dentre vários outros. Destes, 90% teve de ser importado, é claro.

Uma das placas antes do recap

Mesma placa após recap


       Pelas fotos é possível ver que nem todos capacitores foram substituídos exatamente pelo mesmo tipo. Por exemplo, na foto antes do recap se vê 4 capacitores verdes de tântalo, mas após o recap, vemos que para substituir estes 4 capacitores idênticos foram usados 2 tipos diferentes de capacitor. O motivo é exatamente a função de cada capacitor no circuito: hoje temos opções de capacitores que não existiam naquela época, muito mais apropriados para as funções que executam no circuito.



Capacitores modernos de diferentes tipos
    
   
Recap com capacitores EPCOS TDK e MLCC.


    O recap completo necessitou de mais 18h de mão de obra, parte delas em mão de obra de Engenharia para análise dos esquemas e planejamento e decisão dos tipos de capacitores a serem usados em cada posição. O resultado final compensará todo o valor e tempo investidos, pois o equipamento ficará em um estado ímpar, com todos circuitos renovados e exatamente como quando saiu de fábrica! No total, 131 componentes foram substituídos ao fim do reparo, a grande parte deles capacitores, é claro.


Componentes substituídos

    Aproveitamos o desmonte completo das placas do gravador para procedermos com a limpeza e o tratamento de todas chaves e conectores com álcool isopropílico e DeOxit. Havia muita sujeira e oxidação nas chaves, provavelmente pelo fato deste gravador ser horizontal, o que facilita com que partículas de poeira penetrem pela fresta entre os botões e o chassis. Todas chaves e lâmpadas foram testadas após finalizada a remontagem após o recap.
    O resultado final e os testes finais de audição ficarão para a próxima e última parte... aguardem!

segunda-feira, 27 de março de 2023

Gravador de Rolo Studer B67 - PARTE 2

    Temos mais progresso no B67!     

    Na primeira parte desta postagem introduzimos o Studer B67 e apresentamos dicas valiosas sobre a conservação e reparo deste aparelhos Pois bem, agora vamos começar a trabalhar.


Aparelho aberto, como recebido

    Como se pode ver pela foto do equipamento aberto, temos algumas grandes seções funcionais, nas quais se divide o circuito completo. A parte de cima se resume à fonte do aparelho, a placa a esquerda no centro é dedicada às funções do contador, a placa no centro a direita é uma placa de distribuição, enquanto a placa logo abaixo do motor do capstan cuida do controle de velocidade e controle lógico. Por fim, a placa inferior na foto é a placa de interconexão das placas de áudio, que são removíveis pela parte frontal do equipamento. Tudo tem uma lógica, tudo é bem organizado, tudo faz sentido para olhos bem treinados e facilita a manutenção.

    O proprietário deste Studer solicitou um recap completo, ou seja, a troca de 100% dos capacitores originais por capacitores novos. Então vamos começar pelo recap, correto? ERRADO rs.... como falamos anteriormente, o primeiro passo é sempre encontrar os defeitos e corrigi-los. Depois do equipamento estar 100% funcional, aí sim procedemos para um recap e os ajustes e reparos finais.

    O primeiro passo então será diagnosticar alguns problemas óbvios: dois fusíveis da fonte estão queimados, o que sugere um curto. Uma breve inspeção nas fontes de +12V e +21V revela capacitores em curto:

Capacitor em curto
       

    Como esperado, os capacitores em curto são de tântalo, do tipo blue e green. Este Studer específico que recebemos não possui os red devil, mas por mero acaso. O uso dos red devils era comum neste aparelho, mas era dependente da disponibilidade de estoque do fabricante, e a Studer utilizava os blue, green ou red de acordo com a disponibilidade. Investigações mais aprofundadas revelavam outros problemas, como o capacitor do circuito de controle dos motores abaixo.


Capacitor estourado

    Este é um belo exemplar de capacitor bomba relógio, os famosos RIFA. Este daí explodiu no passado e com certeza assustou quem estava próximo do gravador na ocasião. Para este RIFA, a troca é mandatória e tem de ser feita antes de se pensar em ligar o equipamento de volta a rede de energia. É um recap compulsório.

    Continuando nossa inspeção, removemos a placa de fonte, pois ainda havia um curto que após investigações, levantava suspeitas acerca desta placa. Vejam se encontram o problema na foto abaixo, e logo após apontaremos a resposta.


Placa de fonte do B67

    Encontrou o problema? Repare bem no capacitor de tântalo verde no canto inferior direito da foto.... ele está estourado, faltando um pedaço de seu revestimento! Mais um capacitor em curto. Este foi fácil, pois visualmente se diagnostica o problema, enquanto o capacitor de tântalo azul que encontramos em curto antes, estava em perfeitas condições físicas.

    Continuando nossas inspeções e investigações, encontramos um total de seis capacitores com problemas, dois resistores abertos e mais dois transistores defeituosos.  Tudo foi substituído e finalmente pudemos ligar o Studer à rede de energia. Felizmente, o equipamento ligou bem, com todas funções básicas funcionais. A sonoridade observada não estava apropriada, a calibração estava totalmente fora, mas bem, estava finalmente mostrando sinais animadores de vida. Os VUs continuavam apagados e havia certa intermitência na velocidade do capstan, mas neste momento, nada disso é preocupante, e explicarei o motivo. Neste primeiro momento de um restauro, o foco não é em deixar o equipamento perfeitamente funcional, pois seria perda de tempo, já que um futuro recap demandaria nova calibração e novos testes. Não trocamos capacitores e componentes fora de tolerância ainda, apenas trocamos os componentes defeituosos e completamente não funcionais, a fim de deixar o gravador em um estado no qual pudesse ser alimentado e que pudéssemos realizar testes dinâmicos no funcionamento de cada circuito interno. O próximo passo agora será um desmanche completo, com limpeza de todas chaves, troca de lâmpadas queimadas e um recap completo, já que neste momento já estamos com o equipamento em um estágio de base funcional. Nossos testes neste estágio confirmam que a fonte funciona bem, com tensões próximas às nominais, os circuitos de controle lógico respondem como esperado, os circuitos de controle dos motores responde bem, e o circuito de controle de velocidade funciona, mas ainda com instabilidades em certos momentos. 

Placa do capstan

    Repare na placa de controle da velocidade do capstan, alguns detalhes importantes a respeito do que já falamos aqui:

  • No canto superior direito temos um conjunto de chaves, sujeitas a mau contato. Devem ser completamente desmontadas e limpas com álcool isopropílico e tratadas com DeOxit. 
  • Vários capacitores suspeitos estão presentes nesta placa: os eletrolíticos FRAKO e os capacitores de tântalo verdes e azuis. Um rápido teste revelou que dois eletrolíticos estavam com mais de 40% de erro em suas capacitâncias em relação a seus valores nominais. Testes de ESR (resistência em série) revelou valores absurdamente fora da tolerância.
  • No canto esquerdo da foto podemos ver uma linha de conectores verticais, cujos cabos vão para a placa de distribuição. Estes conectores são também uma fonte comum de mau contato, e devem ser limpos e tratados com DeOxit.

Placa de controle lógico

    Repare também na placa de controle lógico acima. É fácil perceber nesta placa outros pontos de atenção:

  • Novamente, muitos capacitores FRAKO e de tântalo verdes e azuis presentes;
  • Muitas chaves e conectores que necessitam desmonte e limpeza;
  • CIs em soquetes, que são outra grande fonte de mau contato e intermitência. Neste caso, os CIs devem ser removidos um a um do soquetes e limpos. Em parte das vezes, quando há oxidação presente, os CIs devem ser trocados juntamente com os soquetes. Recomendamos sempre o uso de soquetes de pinos torneados, por sua maior confiabilidade a longo prazo.
    É isso pessoal, muito trabalho e mais de 15 horas de mão de obra de Engenharia já investidas até aqui. Fizemos a limpeza de toda unidade, limpeza das cabeças e caminho da fita, desmagnetização, troca de componentes de borracha (rolo pressor, borracha do eixo guia, etc) e realizamos limpeza e lubrificação de partes móveis. Cada teste de cada componente envolve a completa retirada da placa da unidade, teste dos componentes em ponte LCR (aqui usamos em bancada um DER EE DE-5000 e um Agilent 4263B), além do subsequente remonte e reconexão de cada placa. Se pensam que o pior passou, estão muito enganados! O pior está por vir, e será uma enorme troca de componentes, mas isso vai ficara para a próxima parte! Nos vemos em breve!

segunda-feira, 20 de março de 2023

Gravador de Rolo Studer B67 com cabeças Butterfly - PARTE 1

É hora de mais uma postagem meus caros! Aqui estamos nós de volta com um novo restauro, direto dos estúdios analógicos deste Brasil!

    A estrela de hoje é um gravador STUDER B67. Vocês devem ter percebido que raramente postamos sobre gravadores de rolo aqui, e isso é porque usualmente não aceitamos este tipo de equipamento para restauro. Explicamos o porquê em nossa postagem anterior, mas de maneira resumida, estes aparelhos fogem muito de nosso core business (nos especializamos em valvulados) e não temos estoque de peças de reposição para eles. Isso faz com que necessitemos importar peças, o que eleva os custos e traz incertezas quanto ao prazo e valores de execução do serviço, dificultando cumprirmos as exigências do código de defesa do consumidor como empresa. No entanto, em certas ocasiões (como no caso de contratos especiais de prestação de serviço), aceitamos estes reparos sob condições previamente negociadas, o que permitirá a vocês acompanhar nosso trabalho e nossas dicas para um tipo de equipamento pouco habitual de se aparecer aqui no Blog :)

    Para quem não conhece, este é um gravador profissional de duas pistas, para fitas de 1/4 de polegada. Existiram várias versões do B67, que podia ser 'customizado' no ato da compra, a fim de atender a necessidade individual de cada estúdio. A versão que apresentamos hoje para restauro é o mais raro deles, a versão MKII com suporte e VUs superiores, no carrinho original Studer, com cabeças do tipo Butterfly. É uma máquina linda, uma peça central e de destaque para qualquer setup hi-end e para nenhum estúdio colocar defeito! Como este será um trabalho muito longo e com muitas explicações ao longo do caminho, vamos dividir em partes nossas postagens do restauro, para não ficar muito longo e monótono. Vou aproveitar para contar um pouco da estória da marca e também dar algumas dicas importantes para quem nunca trabalhou com este tipo de equipamento antes.


Diferentes versões do B67


Par de B67 em uso em estúdio


   Recebemos este aparelho bem tristezinho coitado! Nenhuma das funções básicas funcionava: o transporte não respondia aos comandos, o sinal de áudio de entrada não aparecia na saída monitorada, nenhum dos motores de take up e supply rodava, e nenhum dos VUs acendia ou se movia com o sinal aplicado. Além de tudo isso, o motor do capstan também não funcionava corretamente, girava sempre em velocidade muito baixa (quase parando), independentemente da velocidade selecionada nas chaves de seleção. Em resumo, a única coisa que 'funcionava' eram algumas lâmpadas que acendiam, e mesmo assim, nem todas acendiam! Nenhum botão atuava absolutamente nada.


Studer B67, como o recebemos.

    Para quem não está familiarizado com a marca, vamos começar com uma rápida estória sobre a Studer e a Revox, especialmente para quem não conhece a relação entre ambas. A Studer nada mais é que a empresa mãe, de Willi Studer, que desenvolveu e criou gravadores de rolos para uso profissional desde sua fundação. Com o intuito de diversificar seu mercado e atingir um novo público, a Studer criou uma nova marca, a Revox, destinada a desenvolver equipamentos para uso amador e residencial, enquanto a Studer permaneceu desenvolvendo equipamentos para uso profissional em estúdio e broadcast. Obviamente, sendo empresas sob um mesmo comando, muitas das peças usadas por uma era também usada nos equipamentos da outra, o que nos leva a apresentar brevemente algumas dicas sobre o reparo destes equipamentos.


Willi Studer


   Para quem nunca trabalhou com equipamentos destas marcas, vale a pena ressaltar que são excelentes equipamentos, mas parte dos capacitores usados não envelhecem muito bem. Veja que estamos falando de capacitores com 50 anos de fabricação, e nunca se é esperado que componentes tenham uma vida útil tão grande. Supreendentemente, muitos capacitores japoneses se provaram quase indestrutíveis, mantendo seu perfeito funcionamento mesmo após 50 anos, como os Nichicon, Nippon,-Chemicon, dentre outros. É claro que isso não pode ser tomado como regra absoluta, mas usualmente é difícil encontrar capacitores japoneses (usados no TEAC, Pioneer, etc) muito fora das especificações de maneira sistemática . Infelizmente, estes capacitores não foram utilizados pela Revox e Studer, que optou por capacitores que não envelheceram tão bem, sendo que alguns deles são famosos por apresentarem problemas em larga escala. Seria esperar demais que componentes durassem 50 anos, é claro, e a Studer usou excelentes componentes, que funcionaram bem pelo tempo para os quais foram projetados, mas hoje, com mais de 50 anos de uso, a troca de muitos deles se faz necessária.

    Os primeiros capacitores que iremos alertar aqui são os eletrolíticos FRAKO, usados amplamente nos Revox e Studer. Estes capacitores usualmente não envelhecem bem, mas muitos ainda estão funcionando e ainda dentro da tolerância. Apesar disso, é importante ressaltar que é comum encontrar alguns abertos ou em curto. Vale a pena ficar atento a eles e eventualmente, fazer um recap (troca dos capacitores) com bons capacitores importados (recomendo os japoneses citados anteriormente, ou os Epcos TDK).

Capacitores eletrolíticos FRAKO


    Os segundos capacitores de alerta são os BLUE e GREEN TANTALUM, capacitores de tântalo que podem eventualmente entrar em curto (infelizmente o modo de falha destes capacitores é sempre um curto, o que os torna perigosos em algumas partes do circuito). A troca destes não é mandatória, exceto em seções muito críticas e com CIs impossíveis de se obter. É uma manutenção preventiva.


Capacitores Green Tantalum


    Os terceiros capacitores, cujo alerta é mais severo, são os famosos RED DEVIL. Não é a toa que recebem este nome! Estes devem ser trocados sempre que possível de maneira preventiva, e obrigatoriamente quando estão próximos a circuitos e integrados críticos. Sempre falham em curto, e podem levar consigo outros componentes próximos. 


Capacitor RED DEVIL


    Por fim temos os capacitores RIFA. Estes são conhecidos como TIME BOMBS, pelo fato de serem bombas relógio prontas a explodir a qualquer instante, com direito a um não-tão-belo show pirotécnico. O invólucro destes capacitores falha com o tempo, surgindo trincas através das quais o ar ambiente entra, permitindo a oxidação dos eletrodos internos devido ao oxigênio no ar. O resultado? Um curto direto. O fato destes capacitores serem sempre empregados em pontos de circuito com presença de altas tensões AC (usualmente acima de 100VAC) resulta em danos graves quando falham. Devem ser sempre trocados por capacitores modernos com certificação X2, a qual garante falha em aberto e impede que futuras falhas graves aconteçam novamente. 


Capacitores RIFA

    Como devem ter percebido, o grande ponto fraco dos Revox e Studer são os capacitores, e grande parte dos problemas é causado por eles. É importante lembrar que estas dicas devem ser utilizadas com cautela e bom senso. Não recomendo de forma alguma que alguém decida 'consertar' um equipamento fazendo um recap, pois recap não é conserto! Muito pelo contrário, muitas vezes trocar centenas de capacitores de uma só vez sem antes diagnosticar a causa dos defeitos presentes pode acabar é gerando mais problemas. A troca de centenas de componentes a esmo sempre traz sérios riscos de erros e danos: componentes errados podem ser instalados por engano, a polaridade pode ser inadvertidamente trocada, trilhas das placas de dupla face podem ser danificadas, dentre uma infinidade de outros problemas. Até mesmo os componentes novos devem ser obrigatoriamente testados antes de serem instalados, pois não é muito incomum um componente novo estar fora das especificações, devido a longos períodos em prateleira por exemplo. É muito fácil encontrar em fóruns internacionais uma infinidade de relatos desesperados de pessoas que, ao tentarem 'reparar' defeitos através de um recap, acabaram com equipamentos ainda menos funcionais do que quando começaram, e aí vem o desespero, pois além de achar os defeitos iniciais que continuam presentes (ou se agravaram), ainda é necessário achar e corrigir todos erros cometidos durante o enorme desmanche e recap feito sem necessidade e sem critério. Um risco ainda maior existe: um componente instalado incorretamente pode queimar um CI impossível de se obter no mercado, tornando o reparo agora impossível. Uma observação importante para os Studer é que sempre usam placas dupla face, com trilhas extremamente frágeis, especialmente quando manuseadas com equipamentos de solda e dessolda inadequados. É fácil também achar relatos na internet sobre pessoas que destruíram placas perfeitas e impecáveis ao tentarem dessoldar capacitores desnecessariamente. O correto em um reparo é primeiramente diagnosticar TODOS os problemas, repará-los, e depois de ter certeza que os circuitos funcionam, proceder com a troca preventiva de componentes funcionais, mas sujeitos a problemas no futuro próximo. Proceda sempre com cautela e com calma. A pressa nestes restauros delicados só atrasa o processo, e tentar achar atalhos muitas vezes pode te fazer se perder no caminho. É importante planejar bem, para se executar só uma vez. Como diz o velho ditado americano: plan twice, build once.

Chega de papo né? Bora trabalhar! Compartilharemos o início deste trabalho em breve, na próxima parte, e esperamos que estas dicas e alertas evitem que estes raros equipamentos que tanto tentamos preservar possam ser melhor tratados por quem os guarda, usa e repara :)

Para finalizar, deixo com vocês esta bela propaganda do B67, de uma época em que tudo era feito para durar...



segunda-feira, 10 de janeiro de 2022

Receiver valvulado topo de linha: Scott 399

Primeiramente bem vindos a mais uma restauração da Regence Audio! Espero que todos estejam bem e se cuidando durante esta época de pandemia e gripe.

Hoje vamos restaurar um belíssimo receiver vintage, um Scott 399 100% valvulado!



O Scott 399 foi o receiver topo de linha da Scott, lançado em 1960. Era extremamente 'avançado' para a época, por possuir sintonizador AM e FM integrados, além de entradas de pré de phono, linha, gravadores de rolo, além de inúmeras funções de seleção entre entradas e controles de tonalidade. Este aparelho utiliza as raras e belíssimas válvulas 7189, que são versões robustas e militares das EL84, produzindo 18W de potência por canal em 8 Ohms e pesando mais de 20Kg com seu gabinete. 

O equipamento chegou até nós em estado desconhecido pela proprietária. O mesmo pertencia a seu pai, já falecido, e ficou parado por pelo menos 30 anos sem uso, guardado em um armário. Só recentemente ele foi 'encontrado' e despertou na proprietária o interesse de trazê-lo de volta a seu funcionamento para ser incorporado em uma nova residência que a mesma estava construindo, na qual sua arquiteta iria incorporar itens vintages ao projeto moderno em um mesmo ambiente. Todo áudio deste ambiente seria reproduzido por este Scott, que seria uma peça de destaque na sala.

Quando recebemos equipamentos em estado imaculado de preservação, mas que ficaram parados por muitos anos, todo processo de restauro começa com a tentativa de reformar cada seção de cada capacitor manualmente por pelo menos 3 dias cada. Como estamos falando aqui de um total de mais de 25 seções de capacitores, o processo é demoradíssimo, mas garante uma maior originalidade ao fim do processo.


Capacitores multi-seção e de seção única ainda originais do receiver

O processo de restauro destes capacitores eletrolíticos consiste em primeiramente dessoldar todas conexões a eles, deixando-os isolados do circuito interno. Cada seção é então conectada a uma Ponte LCR da Keysight e analisada por capacitância, fuga, fator Q, dentro outros parâmetros técnicos. No caso deste receiver, que ficou parado por muito tempo, NENHUM dos capacitores estava dentro das especificações. Na verdade, estavam totalmente fora das especificações e teriam de passar por longa reforma.
O processo de reforma consiste em conectarmos cada seção a um equipamento específico de reforma de eletrólitos, o qual gradativamente aplica tensão aos capacitores enquanto monitora a corrente de fuga e a temperatura dos mesmos. Este processo é iniciado e reiniciado várias vezes durante os dias de reforma, ao final do qual o capacitor estará novamente em perfeito estado de uso. Vale lembrar que nem sempre é possível reformar um capacitor: algumas vezes, os mesmo estão com seus eletrólitos internos totalmente secos e não mais funcionarão, tendo de ser substituídos.

Finalizada a etapa de restauro dos capacitores eletrolíticos, o segundo passo foi realizar a medição e consequente troca dos capacitores de acoplamento, visto que os mesmo estavam totalmente fora de tolerância (lembrando que capacitores de acoplamento não são passíveis de reforma).


Capacitores de acoplamento novos instalados

Optamos por usar neste belo receiver capacitores de acoplamento alemães, produzidos pela EROS, os quais temos a venda em nossa loja virtual neste link.

Em seguida testamos as válvulas uma a uma. Infelizmente, uma das raras válvulas de saída 7189 estava em curto e tivemos então de substituir todas as 4 válvulas por um novo quarteto casado. Por sorte, tínhamos em estoque quartetos NOS desta rara válvula e não foi necessária importação, o que agilizou o reparo do aparelho.

Por fim, antes de ligarmos o receiver pela primeira vez, efetuamos a troca do retificador de selênio por um de silício.


O novo e o antigo retificador


Uma rápida medição em bancada revelou que o controle de volume estava extremamente ruidoso, e o mesmo foi desmontado para limpeza.



Potenciômetro de volume

Agora é hora de ligar o receiver pela primeira vez e realizarmos testes preliminares com um Analisador de Áudio. O vídeo abaixo ilustra esta etapa, onde é usado um analisador Agilent 8903B, um Analisador de Espectro HP 3582A, e um computador, que receberá os gráficos resultantes das análises por USB. Todo o processo é automatizado graças ao uso destes equipamentos, que já realizam toda a análise  e traçam o gráfico final de resposta em frequência na tela do computador.





A foto abaixo ilustra a ENORME COMPLEXIDADE do circuito dentro do equipamento... não é um aparelho para ser reparado por amadores ou curiosos!


Scott 399 por dentro

É isso pessoal, o aparelho ficou PERFEITO! Mantivemos o mesmo em testes por alguns dias, como pode ser visto no vídeo abaixo, e então o equipamento foi enviado de volta para sua proprietária em São Paulo, onde o mesmo terá muitos anos de vida com saúde!




Obrigado a todos que acompanham nosso trabalho e um excelente 2022 a todos!!


quinta-feira, 2 de setembro de 2021

Prés Valvulados Vintage

Olá amigos, este será um post informativo e não relacionado a uma restauração específica.

Vocês já tiveram a oportunidade de ouvir a um pré valvulado vintage?

Se a resposta a esta pergunta foi não, você não sabe o que está perdendo! Se já ouviu, sabe do que estamos falando.

Para quem nunca ouviu um pré vintage, recomendo fortemente que tente ouvir um! Pegue emprestado com um amigo, vá a uma loja... não importa como, ouça! A sonoridade dos prés vintage conseguem dar à música uma naturalidade que a grande maioria dos prés modernos compráveis (que não custam fortunas megalomaníacas) nunca alcançarão.

Tente ouvir um McIntosh C11, C20, C22, um Marantz 7, um Altec 440, um par de Scott 121, um Scott 130, um Luxman CL-30. Depois entre em contato conosco e nos conte sua experiência! A dica aqui é se certificar que o aparelho que vai ouvir está funcionando bem e foi revisado por alguém competente. Já vi muitos vintages por aí com uma sonoridade péssima, pois não estavam revisados e funcionando muito precariamente. Aliás, já viu muita gente por aí reclamando da sonoridade de vintages, quando na verdade, o problema não era o vintage em si, mas seu precário estado de funcionamento!



Alguns dos prés vintage que já passaram por restauração na Regence Audio

Vou lhes contar um segredo... estes prés são mágicos, de verdade! Fora do Brasil, especialmente no oriente, estes aparelhos custam uma fortuna e são desejadíssimos quando estão em bom estado.

Aqui em terras tupiniquins, ainda estamos engatinhando em assuntos como vintages valvulados, válvulas NOS, sistemas h-fi clássicos, falantes coaxiais e full range, etc. Como sempre digo, acho que a força motriz que deve levar cada um a buscar 'sua verdade' é a curiosidade... curiosidade em ouvir e conhecer equipamentos novos, estando aberto a experimentar com diferentes combinações de aparelhos e válvulas.

Já que estamos trocando segredos e confidências, vou contar mais um: se você tem um valvulado, não existe melhor upgrade que a troca de válvulas por NOS de qualidade. Esqueça cabos, aterramento, ionizadores de ar, etc. Nada disso chegará perto do enorme ganho que uma simples troca de válvula pode proporcionar, desde que uma boa válvula NOS, de uma boa 'safra', seja usada. Se não acredita, faça o teste e não se esqueça de nos contar o resultado!

Temos uma maravilhosa seleção de válvulas NOS especiais para áudio em nossa loja:

NOSSA SELEÇÃO DE VÁLVULAS AUDIÓFILAS


Grande abraço meus amigos leitores! Em breve tem restauração nova vindo por aí!



quinta-feira, 15 de abril de 2021

Clássico na área! Garrard 301 Grease Bearing.

 Falaaaaa galerinha viciada em vintages! Regence Audio trazendo mais um restauro para vocês!

Hoje vamos falar sobre um restauro muito especial, de um grande clássico para quem gosta dos bolachões, o Garrrard 301 - versão grease bearing.

Este equipamento precisava de um restauro completo, e a ideia seria seu uso dedicado a tocar vinis mono, para um setup totalmente dedicado à audição de vinis originais em gravações mono. 

E foi assim que tudo começou ...



    O primeiro passo é sempre dar uma verificada em tudo que necessita ser importado para o restauro, pois importações sempre levam tempo e quanto antes fizermos os pedidos, melhor! Por sorte, para estes Garrard clássicos, se acha de tudo para comprar lá fora, sem dificuldades. Ainda existe enorme demanda por estas peças, o que comprova que muitos destes ainda estão sendo usados ao redor do mundo, mesmo tendo sido fabricado a partir de 1953!

   

    Tínhamos apenas o toca discos e o prato. Nenhum braço, nenhum mat, nenhum plinth. Tudo teria de ser importado. Além disso, percebemos que a alavanca de troca de velocidade foi trocada por um knob.


    Hora de colocar a mão na massa! O primeiro passo foi desmontar e lubrificar tudo. Um ponto importante a ressaltar para este Garrard é que ele é a versão mais desejada, a grease bearing, ou seja, por rolamento com graxa e não por óleo. De cara quando desmontamos o aparelho percebemos que ele estava todo lubrificado incorretamente com óleo, e não com a graxa correta. Para que o Garrard 301 funcione corretamente, na velocidade correta, com o knob de velocidade dentro do range ajustável, é essencial que a lubrificação seja toda feita com graxa, e uma graxa super especial, de baixíssima viscosidade. Use graxa comum e ele girará lento demais, use óleo e ele girará muito rápido, algumas vezes até sendo impossível um correto ajuste pelo knob de controle de velocidade... fica a dica! Tem que usar a graxa correta!






Tudo desmontado, limpo, seco. Hora de remontarmos e aplicarmos a graxa! Como a graxa é bem líquida, pode ser aplicada com uma seringa.





Agora olhem a situação do cabo de força, que foi trocado por um aterrado para maior segurança de operação:


Enquanto isso as peças que importamos chegaram! O plinth custou uma fortuna para ser importado, já que ele por si só já pesa quase 16Kg. Recebemos o plinth, o mat original NOS, o braço e a alavanca de mudança de velocidades, também original.





Hora de começarmos a montagem enquanto as outras peças importadas não chegam.





O braço escolhido foi um Rek-O-Kut S160, pois ele seria perfeito para o uso deste toca discos: aceita cápsulas mono de relutância variável com troca rotativa de agulhas e toca vinis de qualquer tamanho, até 16 polegadas mono antigos. A ideia é que este Garrard seja um toca discos capaz de tocar qualquer disco mono que exista, por mais raro e maluco que seja. 


    Braço com perfeito encaixe e alinhamento, hora de garantir que o toca discos também está com encaixe perfeito na base!


Tudo perfeito, está começando a ficar bonito hein?!?!

Enquanto isso, chegaram mais peças! Resolvemos usar neste toca discos a cápsula mono mais clássica e glorificada da década de 40. Encontramos uma novinha na caixa, nunca usada, comprada em 1949! Olha que raridade...




    Apresento-lhes a belíssima GE RPX-053 Golden Treasure. Esta é a cápsula certa para quem quer ouvir um autêntico vinil mono de 1940, e tem uma enorme flexibilidade, já que possui troca de agulha rotativa, podendo ser usada em vinis mono de 78, 45 e 33 rpm.

    Para dar um toque ainda mais charmoso ao Garrard, conseguimos importar também o disco promocional original da Garrard que vinha com o 301, para encaixe no mat. 


    Por fim, importamos também um clamp usinado em alumínio cru, para combinar com o braço Rek-O-Kut e arrematar a beleza desta obra prima!



Vejam como ficou lindo!!



Agora, o único jeito de entender mesmo a beleza deste Garrard em funcionamento é com um vídeo não é! Pois aqui está!






Obrigado a todos por acompanharem nosso trabalho e até a próxima!